Direito do Consumidor: O caso 123 Milhas
- Frederico Gorski
- 22 de ago. de 2023
- 4 min de leitura
Atualizado: 23 de ago. de 2023

Nos últimos dias, ganhou as manchetes o anúncio da 123 Milhas de suspensão da emissão de passagens e hospedagens dos pacotes promocionais da Empresa, para o período de setembro a dezembro de 2023.
Segundo o comunicado da empresa, os consumidores afetados seriam compensados por meio de Voucher para compras no site, com reajuste de 150% do CDI, mais juros de mercado (baseado na Taxa Selic que, atualmente, é de 13,25% ao ano).
Este artigo será dividido da seguinte forma: o que se sabe sobre o caso, quais as medidas já tomadas pelas autoridades brasileiras, as consequências previstas no Código de Defesa do Consumidor e quais as medidas podem ser tomadas.
O que se sabe sobre o caso 123 Milhas
As informações disponíveis sobre a suspensão anunciadas pela 123 Milhas, por ora, não esclarecem com muita precisão o que realmente está acontecendo com a empresa. Sabe-se que a decisão foi tomada com base na oscilação do mercado de passagens aéreas e de hospedagem, que superaram a capacidade da empresa de suportar prejuízos com os pacotes ofertados.
Nesse sentido, cabe fazer um pequeno esclarecimento sobre como a empresa procede quanto às ofertas disponibilizados.
A 123 Milhas, para oferecer os pacotes promo (às vezes, chamado de flex), monitora o mercado de turismo e, com base nas informações de anos anteriores, aposta no desaquecimento das passagens e estadias num determinado período, digamos, setembro de 2023. Então, ela calcula um preço de oferta com base na expectativa de ganhos, ou seja, se ela cobra de você R$ 5.000,00, ela espera encontrar passagens por menos do que isso, e assim ter lucro.
O que a empresa alega é que a oscilação de mercado fez com que o custo para suspender os pacotes se tornasse menor do que os custos para cumprir com o contrato. Em outras palavras, a empresa começou a ter prejuízo e isso acionou um mecanismo de defesa para a empresa não quebrar.
Ainda assim, por melhor que a oferta de compensação possa parecer, houveram diversas violações aos direitos do consumidor, pois esses não tem a opção de receber em dinheiro a quantia paga, com os acréscimos legais.
Isso é basicamente toda a informação disponível no momento. Elas são insuficientes para dar um prognóstico do que vai acontecer, o que é grave.
Quais as medidas tomadas pelas autoridades?
O anúncio da operadora acendeu muitos alertas, não apenas na população, mas também no governo. Além da lesão direta aos consumidores que compraram os pacotes, as medidas adotadas pela empresa põem em risco muitos outros consumidores, com possíveis efeitos negativos no mercado, como aumento nos preços com a consequente diminuição da demanda e desaceleração do setor que, nesses últimos meses, cresceu.
Até agora, os Procons de SP e de Fortaleza notificaram a empresa, solicitando esclarecimentos. O Ministério da Justiça, a seu turno, pronunciou-se no sentido de que a compensação oferecida pela empresa na forma de voucher não pode ser impositiva, além de promover, junto com o Ministério do Turismo, uma investigação sobre o caso. O próprio MT anunciou diversas sanções, incluindo retirada da 123 Milhas de cadastros necessários para linhas de crédito. No Congresso, deputados solicitaram a investigação do caso no âmbito da CPI das Pirâmides Financeiras.
Medidas para tentar reverter o quadro estão sendo tomadas, mas não sabemos se elas serão efetivas, porque não sabemos o tamanho do rombo que acomete a operadora de pacotes.
A questão, no entanto, é outra. Se você leu o item anterior, já deve ter percebido que, aparentemente, a empresa fazia especulação no mercado de turismo com o dinheiro do consumidor.
O que diz o Código de Defesa do Consumidor?
O Código de Defesa do Consumidor completa, por coincidência, no dia 11 de setembro, 33 anos. Essa jovem lei precedeu um período de aceleração no desenvolvimento de novas formas de tecnologia e negócios que não tem precedente na história. Mesmo assim, aparentemente, ela lidou bem com as vicissitudes e permanece dando soluções para problemas contemporâneos. As alterações que houveram não alteraram a sua substância e, em grande medida, desenvolveram o seu núcleo duro de princípios, que são a razão de sua longevidade.
No caso da 123 Milhas, há diversas violações, que devem ser avaliadas caso a caso. O anúncio da empresa fere princípios como o da boa fé objetiva, o da transparência, o da proteção dos interesses econômicos dos consumidores, entre outros, além de ser abusiva.
Em termos gerais, o artigo que vem sendo mais destacado é o art. 35, que dá ao consumidor, ante a recusa do cumprimento da oferta, o direito de: 1) exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade; 2) aceitar outro produto ou prestação de serviços equivalentes; 3) rescindir o contrato, com direito à restituição da quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos.
O que fazer agora?
Sempre que temos problemas com fornecedores, é preciso manter a calma e fazer passar a aflição, antes de tomar uma atitude, ainda que nessas horas tudo pareça urgente.
Normalmente, é aconselhável entrar em contato com o SAC da empresa, ANOTAR O NÚMERO DE PROTOCOLO, e, caso o problema não seja resolvido, é aconselhável fazer denúncia em plataformas como consumidor.gov.br ou reclame aqui.
Neste caso, o conselho é buscar a ajuda de um(a) advogado(a), e tomar essas medidas sem aceitar nada menos do que, ou o cumprimento da obrigação, ou a devolução em dinheiro com o valor corrigido, preferencialmente nos mesmos moldes do ofertado no voucher. Não aceite nada além (ou aquém) disso sem consultar um(a) advogado(a).
E não aceite o VOUCHER, pois já há diversas reclamações sobre as condições de uso dessa compensação que, definitivamente, são muito abusivas e desfavoráveis ao consumidor.
Sempre mantendo a calma, faça isso logo, porque é necessário agir antes que coisa pior aconteça.