Direito do Consumidor: Dicas Básicas
- Frederico Gorski
- 27 de ago. de 2023
- 7 min de leitura
Este artigo trata de aspectos gerais do Direito do Consumidor e traz algumas dicas para tentar solucionar problemas de forma mais rápida e sem necessidade de um processo judicial. Vamos entender: o que é o direito do consumidor, quais os direitos que estão previstos em lei, o que é uma oferta, aspectos processuais e dicas para se precaver e buscar soluções extrajudiciais. Você pode pular para cada uma das seções clicando acima.

O que é o Direito do Consumidor
Direito do Consumidor é o ramo do direito que cuida das relações no mercado de consumo. Sua base é o direito das obrigações, com um tratamento diferenciado tendo em vista a situação de vulnerabilidade do consumidor frente ao fornecedor.
A vulnerabilidade se apresenta desde o início da relação de consumo. O consumidor não possui a mesma capacidade financeira nem técnica que o fornecedor, que é responsável pela satisfação do interesse do comprador com o produto, de acordo com as especificações técnicas e a oferta.
Quem coloca produto ou serviço no mercado insere-se dentro da teoria do risco e tem responsabilidade objetiva (independente da intenção de causar dano, ou de negligência, imperícia ou imprudência). A exceção da responsabilidade objetiva se aplica aos profissionais liberais que desempenham atividade meio, como médicos, dentistas etc.
Desse modo, na maioria das situações, há vulnerabilidade econômica e técnica. A vulnerabilidade também gera uma presunção relativa de hipossuficiência, que, se presente, gera a inversão do ônus da prova, no processo.
Considerado tudo isso, é importante que se saiba que o Direito do Consumidor não se restringe ao Código de Defesa do Consumidor. Na realidade, o Código, a partir da Constituição Federal, insere no Ordenamento Jurídico (conjunto de leis que rege a vida em sociedade) o princípio da proteção ao consumidor.
O Direito do Consumidor, assim, é um microssistema de fundamento constitucional, coordenado pelo CDC. Em outras palavras, o Código relaciona-se com as demais leis para que a solução mais adequada desde a ótica do consumidor seja alcançada.
Assim, surge a Teoria do Diálogo das Fontes, ou seja, diante de uma situação específica, busca-se a norma mais favorável, de forma coordenada pelo CDC - por exemplo, os planos de saúde possuem lei própria, mas o CDC atua para harmonizar esta lei com o sistema de defesa do consumidor.
Além disso, o CDC é uma lei que dá comandos ao poder público para atuar preventivamente e aplicar sanções às empresas que apresentem comportamentos que causam ou podem causar lesão ao consumidor. É o que estamos vendo, no momento em que é escrito este texto, com o anúncio de suspensão da 123 Milhas.
Quais os direitos do consumidor?
Os direitos básicos do consumidor estão inseridos no art. 6º do Código de Defesa do Consumidor. Mas não apenas, por todo o código podemos encontrar outros direitos, como ocorre no artigo 35, que trata dos direitos ante a recusa do fornecedor em cumprir com os termos da oferta.
Vejamos o que diz o artigo 6º. São direitos básicos do consumidor:
I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos; |
II - a educação e divulgação sobre o consumo adequado dos produtos e serviços, asseguradas a liberdade de escolha e a igualdade nas contratações; |
III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; |
IV - a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços; |
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas; |
VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos; |
VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados; |
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; |
IX - (Vetado); |
X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral. |
XI - a garantia de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento, preservado o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, por meio da revisão e da repactuação da dívida, entre outras medidas; |
XII - a preservação do mínimo existencial, nos termos da regulamentação, na repactuação de dívidas e na concessão de crédito; |
XIII - a informação acerca dos preços dos produtos por unidade de medida, tal como por quilo, por litro, por metro ou por outra unidade, conforme o caso. |
Parágrafo único. A informação de que trata o inciso III do caputdeste artigo deve ser acessível à pessoa com deficiência, observado o disposto em regulamento. |
Trata-se de um rol bastante extenso, que atende à dignidade da pessoa humana, a boa fé objetiva, a transparência, a informação qualificada e vai até a proteção ao superendividamento, introduzida em 2021 pela Lei 14.181, passando ainda pelos direitos à saúde, meio ambiente e proteção contra a concorrência desleal.
Oferta e Publicidade
Antes de mais nada, oferta não é sinônimo de promoção. Esta é veiculada por aquela, mas na maioria dos casos há oferta, sem promoção. O termo se refere à própria colocação do produto no mercado, garantias oferecidas, preço e condições de pagamento, entre outras.
Tudo o que consta da oferta adere ao contrato, ou seja, a maneira como o fornecedor oferece o produto é a maneira como ele deve cumprir com a obrigação. Salvo, claro, quando a própria oferta é abusiva.
A publicidade, por sua vez, é o oferecimento do produto por estratégia de marketing. Ela deve ser fácil e imediatamente identificável, pois não se pode, por exemplo, fazê-la por meio de texto que pareça notícia.
Oferta e publicidade devem ser suficientemente precisas e ambas aderem ao contrato e vinculam o fornecedor. Ou seja, o consumidor pode exigir o quê e exatamente o quê lhe foi ofertado.
Portanto, quando você se depara com um anúncio, preste atenção no que ele diz a respeito do produto/serviço, porque isso está inserido no contrato. A oferta deve conter, segundo o art. 31: informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa a respeito de características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem; e informações sobre riscos à saúde e segurança dos consumidores.
Além disso, pelo princípio da transparência, temos que as condições que importem ônus ao consumidor (ou seja, obrigações que o consumidor deva cumprir, condicionantes ao preço promocional, juros, reajuste, entre outras) devem ser informadas de forma clara e precisa, tanto na oferta, quanto nos comprovantes do serviço ou produto.
Em caso de recusa ao cumprimento da oferta, o consumidor tem direito a, segundo o art. 35:
exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade |
---|
aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente |
rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos. |
Você também pode consultar o próprio Código, que é de fácil leitura. Isso é bem importante para as dicas que vamos ver em seguida.
Aspectos processuais
Quando advogados falam que se deve evitar o processo, a reação das pessoas é de surpresa. A questão é que estamos experimentados nas dificuldades do litigio judicial, ainda quando os clientes tenham muita razão, e, algumas vezes, toda razão.
Ocorre que certeza sobre o resultado de uma demanda não se pode ter de forma absoluta. Os direitos em abstrato não garantem resultado, que depende sempre do caso concreto - ou melhor, depende de saber se o caso está abarcado pela norma.
Ainda deve-se considerar fatores tais como: custo do processo (econômico e emocional), tempo até o alcance da satisfação do direito, e, claro, o risco de se perder o processo e, com isso, o direito.
Além disso, a requisitos a se cumprir. O principal a se ter em mente é o interesse de agir, que é uma condição para ingressar em juízo.
O termo é de fácil compreensão: se a solução poderia ser alcançada com a notificação eficaz do devedor, não há interesse de agir. Ou seja, se Caio deve algo a João e atrasa o pagamento, cabe a João exigir a prestação e, só depois da resistência, terá interesse na ação.
No caso do Direito do Consumidor, a recusa do Serviço de Atendimento, ou da própria loja, em cumprir o acordado, já poderia preencher o requisito. No entanto, é comum que se exija, pelo menos, a tentativa pelo Serviço de Atendimento.
Ainda assim, a satisfação do direito do consumidor pode ser alcançada por outro meios alternativos, como sites especializados em receber e publicar reclamações.
Embora haja divergência sobre se esses devem ser exigidos como condição para a ação, buscá-los é interessante por três razões.
Primeiro, porque muitas vezes eles bastam para que o consumidor obtenha o que deseja, em menor tempo e sem custos financeiros. Segundo, porque se persistir o problema, não haverá dúvida sobre o interesse de agir. E, terceiro, porque os pedidos se reforçam, especialmente perdas e danos, responsabilização civil, danos morais e desperdício do tempo útil do consumidor, pela recusa do fornecedor em dar a solução, mesmo quando por esses meios.
Essa tentativa tem como custo o tempo e a paciência, mas, se não houver má-fé na proposta do fornecedor, será muito mais rápida e sem gastos monetários.
Dicas para se precaver e buscar solução extrajudiciais para o conflito
Finalmente, vamos às dicas! Se você leu o texto até aqui, já deve ter antecipado algumas das sugestões que farei.
É preciso tomar as precauções devidas e ter calma e objetividade na adoção de medidas extrajudiciais.
Primeiro passo
Anotar a oferta e guardar a publicidade, antes da compra.
Se você faz uma compra pela internet, copie o endereço do produto ou serviço e entre no site perma.cc. Se você não fala inglês, clique no tradutor do google chrome, faça a inscrição e crie uma cópia da oferta, inserindo o endereço da página do produto, e/ou da oferta. O site vai criar um link permanente, uma versão da página no momento em que você a acessou.
Se o fornecedor mudou indevidamente a oferta, você tem a prova.
Esse link deve ser guardado. Ele é importante para: exigir o produto nos termos da oferta (caso haja mudança abusiva) e servir como prova tanto na busca extra como na judicial.
Segundo Passo
Por pior que seja o prejuízo e o transtorno, agir de cabeça quente não vai ajudar e agir sem calma pode levar você a aceitar uma solução que na verdade não gostaria.
CALMA é fundamental, sobretudo porque você vai tratar com atendentes, que são funcionários do fornecedor e não o fornecedor. Eles seguem as instruções que lhes são passadas e não tem responsabilidade por isso.
Além disso, tratar as pessoas com respeito e cordialidade aumenta as chances de êxito.
Faça o seguinte: Anote o problema (defeito ou vício), o dia em que aconteceu e qual(is) a solução você deseja. Entre em contato com o atendimento e anote o número do protocolo TODA vez que você fizer uma tentativa. E, ainda, seu tempo útil (tempo de lazer incluído) que o fornecedor desperdiçou nas chamadas, sem solucionar o seu problema.
Terceiro passo
A solução não foi alcançada? Agora é a hora de ou entrar em juízo, ou apresentar uma reclamação.
Você pode fazê-la no Procon do seu Estado ou Município, ou por um site especializado, como o Reclame Aqui.
Eu vou falar sobre o consumidor.gov.br, que é uma plataforma governamental, na qual as reclamações são informadas ao Procon, que as homologa. Mas as dicas sobre descrição e pedidos vale para todos os sites.
Agora, você já tem informações e provas (lembre do Primeiro Passo).
Além disso, se você leu até aqui, sabe dos seus direitos e sobre o que pode exigir(clique para ir ao trecho mencionado).
Hora de publicizar a sua reclamação. Anote o tempo que você vai levar para tudo isso e para a reclamação.
Entre em consumidor.gov.br e entre com sua conta gov.br, conforme abaixo:

Em seguida, crie em nova reclamação:

Identifique a empresa e preencha o formulário.
Para fazer a reclamação, você precisará usar as dicas do segundo passo. Escreva objetivamente: a data da compra, a descrição rápida do produto (com o permalink que você criou), a descrição do problema, as tentativas de solução pelo SAC, e, se quiser, pode enumerar alguns direitos, que você pode buscar também no Código.
Ao final, você poderá anexar documentos. Veja abaixo:

Você não precisa de uma advogada para fazer isso, MAS, a depender da situação, consultar uma pode ser importante. Também, o próprio advogado pode redigir a reclamação, que corre em 10 dias, enquanto vai se preparando a ação, caso necessário.
Se você conseguiu sozinho resolver seu problema, parabéns. Se não, junte tudo isso e leve a um advogado. Isso vai ajudá-lo e a você também.